Agroecologia: Mudança de Paradigmas no Distrito Federal

Rev. Bras. De Agroecologia/nov. 2009 Vol. 4 No. 2 Resumos do VI CBA e II CLAA
TÍTULO: Agroecologia: Mudança de Paradigmas no Distrito Federal

PRATES, Cristine da Silveira Figueiredo, cristine_silveira@hotmail.com;
NASCIMENTO, Roberto de Sousa, roberto.uni@gmail.com.

Resumo
No estudo foram apresentadas três propriedades localizadas no Distrito Federal que produzem de forma ecológica, sendo que duas delas são associadas a outros produtores para escoarem as mercadorias e trocarem informações técnicas, e uma tem características mais empresariais e domina o mercado de orgânicos dentro DF. Concluí-se que o desenvolvimento rural sustentável é viável mesmo adotando diferentes estratégias para atender a um mercado em ascensão cujos consumidores são mais exigentes em relação à origem de seus alimentos, mas que, como moradores de um centro urbano, preferem as facilidades dos mercados.

Palavras-chave: Conhecimento Agroecológico; Sustentabilidade; Transição agroecológica.

Contexto

Aquecimento Global, stress hídrico, mutações genéticas, aumento considerável de desastres naturais. A Terra está mudando. Os seres humanos são os maiores responsáveis por essas mudanças catastróficas, e deve partir deles alguma solução. A agroecologia pode amenizar os impactos, principalmente os gerados pela agricultura moderna advinda da revolução verde. A agroecologia surge como uma nova ciência no processo de transição da agricultura convencional para a ecológica. As práticas agrícolas ecológicas levam em consideração princípios éticos, políticos, culturais, ecológicos, econômicos e sociais, viabilizando uma produção equilibrada.

O objetivo desse trabalho foi relatar experiências de três propriedades familiares situadas no entorno de Brasília, que passaram pela transição de um modelo de agricultura convencional para um de base mais sustentável. Entender como funciona o uso da agroecologia em culturas familiares no Distrito Federal, verificando as alterações causadas nas famílias e no meio ambiente, para isso, serão apresentados estudos de caso descrevendo algumas práticas de agricultura ecológica e seus projetos de educação ambiental.

A metodologia aplicada ao trabalho foi de pesquisa bibliográfica relacionada ao tema, entrevistas informais e aplicação de questionários em três propriedades do Distrito Federal que realizam sua produção forma ecológica, sendo elas Sítio Geranium, Fazenda Malunga, e Chácara Frutos da Terra. O questionário foi previamente estruturado com questões abertas, foram gravados e anotados os comentários e observações dos entrevistados. A intenção do questionário foi de reunir informações sobre as formas de produção ecológicas desenvolvidas no DF, escoamento dos produtos, ações de educação ambiental e demonstrar os benefícios descritos pelos produtores que aderiram a uma cultura mais sustentável.

Descrição da Experiência

Essas experiências são realizadas no Distrito Federal, onde o Bioma encontrado é o Cerrado, que possui relações ecológicas e fisionômicas com outras savanas da América, África e Austrália, é caracterizado por invernos secos e verões chuvosos. Possui na sua maioria solos ácidos com cobertura vegetal não florestal e abriga uma riquíssima biodiversidade (EITEN, 1993).

Os projetos abordados no presente trabalho foram: Sítio Geranium, Fazenda Malunga, e Chácara Frutos da Terra.

A - O Sítio Geranium: é uma propriedade familiar com uma área de 13,6ha, situada no Núcleo Rural de Taguatinga chácara 29, e vem desenvolvendo a agroecologia desde 1986. Segundo os proprietários Maria Abadia Barberato e Marcelino Barberato o motivo da implantação do projeto agroecologico foi devido o modelo convencional usar produtos químicos, tóxicos aos seres humanos e ao meio ambiente. A produção de alimentos é livre de contaminantes, ajudando a promover o manejo sustentável da região e preservação ambiental.

O escoamento da produção é feito através de feiras da AGE, no Mercado Orgânico e vendidas no próprio sítio. Além disso, são produzidas mudas que são comercializadas em feiras e no Mercado Botânico do Casa Park. O Sítio Geranium também realiza ações permaculturais como o banheiro seco compostável, terraceamento e pequenas construções com superadobe. O Sítio faz parcerias com associações como a AGE, Associação de Agricultura Ecológica, a APRONTAG – Associação dos Produtores do Núcleo Rural de Taguatinga, Associação do Mercado Orgânico da Ceasa - Distrito Federal e a ONG Mão na Terra, que promove cursos de práticas ambientais e projetos
com Horta Ecológica e atividades com Plantas medicinais/aromáticas e Resíduos sólidos.

Entre as atividades desenvolvidas no Sítio Geranium podem ser citadas os Sistemas Agroflorestais, as Ações Pedagógicas com foco na sustentabilidade rural e uma Sala Verde com acervo bibliográfico de assuntos referentes ao meio ambiente. Apesar de considerarem que a implantação do projeto foi bem sucedida, os proprietários informaram que a venda dos produtos não é suficiente para sustentar a propriedade. Isto talvez se deva ao investimento em ações de educação ambiental e propagação da agroecologia que a propriedade executa junto à sociedade para gerar uma maior conscientização destes em relação à agricultura sustentável.

O Sítio Geranium possui poucos empregados e muitos voluntários que atuam como guia nas trilhas ecológicas dentro da propriedade, professores de educação ambiental, esses voluntários também realizam trabalhos de mutirões agroecológico para manter o funcionamento do sítio.

Como citado acima, a prioridade do Sítio Geranium não é a lucratividade sobre a venda de orgânicos, mas sim a manutenção do sítio e disseminação do seu trabalho.

B - A Fazenda Malunga: é uma empresa privada, que desenvolve ações agroecológicas há mais de 15 anos, sendo que o projeto foi implantado através de uma turma de agronomia da UNB. O motivo da escolha pelo projeto agroecológico segundo Clevina Valle, Sócia Gerente da Fazenda Malunga, foi de buscar uma forma alternativa de produção visto que os alunos de agronomia da UNB estavam decepcionados com o que viram no campo na forma convencional de se produzir, principalmente hortaliças. Segundo informações passadas pela gerencia da empresa, no processo de produção há integração de atividades e diversificação de culturas. Também alega ser comprometida com a preservação do meio ambiente e a qualidade dos alimentos que produz, não utilizando agrotóxicos em suas culturas.

A Fazenda Malunga tem uma área de 110 ha situada no PAD-DF a 70 km de Brasília e produz hortaliças, laticínios, aves e ovos caipiras. Os produtos são entregues em residências através do serviço de entregas ou vendidos através de feiras, lojas de produtos naturais e supermercados, são vendidos em média 8.000 itens/dia.
Os produtos orgânicos produzidos na Fazenda Malunga, são embalados em bandejas de isopor e filme plástic  conforme os padrões exigidos pelos supermercados para
comercialização das hortaliças.

A Fazenda Malunga segundo Clevane é a maior produtora de orgânicos do DF, além de vender seus produtos nas feiras da AGE (Associação de Agricultores Agroecológicos) e no Mercado Orgânico (supermercado de orgânicos situado na Ceasa) abastece a maioria dos supermercados da cidade. Porém a empresa não vende aos supermercados a produção dos agricultores familiares das associações que é filiada. Comercializa em média 200 toneladas/mês de produtos, cinco vezes maior que a do Mercado Orgânico, (40 tonelada/mês) com 15 produtores e treze vezes maior que da AGE (15 toneladas/mês) com 8 produtores associados.

C - A Chácara Frutos da Terra: está na produção orgânica desde 1994, e produz em média de 2 a 3 toneladas/mês de hortaliças, frutas e ovos caipiras. O escoamento da produção é feito pelo Mercado Orgânico da Ceasa e por vendas na própria chácara. Está localizada no cinturão verde no Núcleo Rural de Taguatinga. A propriedade além da produção orgânica desenvolve atividades como a agrofloresta e a bioconstrução. Realiza parcerias com várias entidades como a Emater, Embrapa, Sebrae, CNPq .

Resultados

Em todas as experiências aqui relatadas os proprietários decidiram mudar para uma agricultura de base ecológica por conta própria, nenhum deles foi estimulado inicialmente por projetos de empresas privadas ou de governo, as parcerias relatadas nas experiências surgiram após a transição inicial ter ocorrido. Cada um com a sua peculiaridade decidiram sair da agricultura convencional rumo a uma agricultura ecológica. Segundo Caporal e Costambeber (2007), o desenvolvimento rural sustentável vem seguindo duas linhas, uma defendendo a cultura de base ecológica, incorporando a justiça social e a proteção do meio ambiente, independente do rótulo comercial gerado no produto. A outra busca mercado de nicho, apenas substituindo insumos químicos pelos orgânicos, se orientando em expectativas econômicas, normalmente individuais e de curto prazo, minimizando os compromissos éticos e socioambientais, podendo comprometer a sustentabilidade a médio e a longo prazo.

Pelos estudos avaliados, no Distrito Federal seguem da mesma forma, pequenos produtores rurais unidos com a sua produção de base ecológica concorrem com uma cultura de orgânicos, de larga escala, que pode até estar baseada em mão-de-obra assalariada e mal remunerada. Além disso, nas feiras de orgânicos os produtos são expostos nas bancas sem embalagens o que não ocorre nos supermercados, vindo a gerar resíduos não degradáveis como o plástico e isopor.

Esse tipo de agricultura que se diz sustentável poderá atender vontades de consumidores informados dos benefícios de se alimentar com produtos “limpos”, porem esse consumidor não terá a garantia das condições sociais que foram produzidos os alimentos, talvez isso nem lhe interesse, “o importante hoje é consumir  orgânicos”. A produção não será verdadeiramente sustentável se as questões éticas não forem consideradas.

Para que as próximas gerações não recebam como herança um planeta árido a implantação de atividades ambiental, social e economicamente sustentáveis, deve ocorrer de forma célere e extensiva.

O conhecimento agroecológico surge modificando pensamentos, sendo eles essenciais para a substituição dessas práticas agrícolas impactantes e insustentáveis, porém para sua adoção se fazem necessárias mudanças de paradigmas por parte da população.

Outro ponto a ser destacado que dificulta a transição do modelo convencional para o pensamento agroecológico é a falta do interesse político. Seria de extrema importância a atuação do poder público, atuando nessa transição, através de políticas especificas, voltadas para promover a difusão de práticas agroecológicas junto aos pequenos produtores rurais, sendo mais viável a utilização dos instrumentos agroecológicos na construção de um desenvolvimento rural mais sustentável. Esse apoio poderia ser na forma de crédito agrícola, assistência técnica capacitada em agroecologia e a viabilização de canais para comercialização, aproximando os produtores dos consumidores e diminuindo o número de mediantes nesse processo. Pelo que pode ser visto nesse trabalho a transição nos casos estudados foi feita por iniciativa pessoal dos produtores, contando apenas com o apoio de outros pequenos proprietários que também adotaram a produção ecológica e se reuniram em associações, o apoio governamental e empresarial surgiu apenas depois da transição. Todos os produtos orgânicos produzidos são escoados facilmente, o que falta são mais propriedades que adotem um estilo mais sustentável de produção, pois a sua produção final gera equilíbrio social, econômico e ecológico.

Por meio deste trabalho foi possível diagnosticar a viabilidade da prática da agricultura ecológica em alguns pontos do DF, que se estabelece como demanda de um mercado de consumidores cada vez mais exigentes com a qualidade dos alimentos que consomem. Nessa parcela de consumidores cresce também a daqueles preocupados com a “saúde” ambiental do Distrito Federal e que preferem produtos oriundos de empresas ecologicamente responsáveis.

Após analisar essas experiências surgiram novas idéias e contextos, pensamentos que não eram comumente acessados. Olhar para um alimento no mercado ou na feira e parar para pensar de onde ele veio, como foi produzido, que pessoas e como elas foram envolvidas no processo de produção. A mudança de paradigma deve acontecer não só no lado na produção, mas também na visão dos consumidores, empresários, políticos, em toda a sociedade, motivando os agricultores para uma forma de produzir mais saudável, mais justa, que se preocupa com a qualidade do meio ambiente, para que no futuro todos tenham acesso a produtos de qualidade como podemos ter agora.

A idéia da produção deste trabalho é auxiliar nessa mudança de pensamento. Espero
assim que as informações reunidas neste texto possam ser utilizadas como um meio de propagação dos princípios da agroecologia comprometidos com a real sustentabilidade.

Referências

CAPORAL, F.R.; COSTABEBER, J.A. Agroecologia e Extensão Rural: Contribuições para a promoção do desenvolvimento rural sustentável. Brasília: MDA/SAF/DATER, 2007.

EITEN, G. Ocupação Humana de Brasília. In: PINTO, M.N. Cerrado: Caracterização, Ocupação e Perspectivas. 2.ed. Brasília:Universidade de Brasília, 1993. p. 17-21.


FAZENDA MALUNGA. Fazenda Malunga - Nossa Historia. Disponível em: . Acesso em: 10 maio 2009.

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